Tirar uma soneca sem ser atacado por predadores é uma
tarefa complicada, mas cada espécie encontra o seu jeitinho. Alguns se
aconchegam por entre os galhos no alto das árvores, outros procuram buracos em
rochas e tem até aqueles que dormem na água. Mas, quando chega a hora de
procriar, é preciso ter um lugar quentinho e seguro para pôr seus ovos. E é por
esta razão que os pássaros constroem seus ninhos. Seria algo simples, não fosse
a beleza e a complexidade envolvidas nesta construção. Estes pequenos
arquitetos utilizam-se dos mais variados tipos de materiais e constroem verdadeiras
obras de arte.
Quando começamos a escrever este post nossa intenção era tão
somente falar sobre os ninhos. Mas encontramos tantas curiosidades, tantas
construções perfeitas e inusitadas que ficamos com vontade de publicar tudo
aqui no blog! Mas aí o post ficaria gigante.... Então decidimos dividir e
mostrar um pouquinho de cada vez.
E pra começar escolhemos o João-de-barro (Furnarius rufus).
Seu nome vem de sua grande habilidade em manipular o barro
úmido, matéria prima utilizada para
construir seu ninho. Mas não é só isso não... ele também usa esterco misturado
a palha. Esta mistura evita rachaduras.
Geralmente
escolhe o alto das árvores, postes e as beiradas das casas para se instalar.
Macho
e fêmea constroem sua casinha juntos, em formato de forno de barro. E não se importam em trabalhar o
dia inteiro. A construção do ninho demora entre 18 dias e 1 mês,
dependendo muito da quantidade de material disponível. (Em tempos de chuva, o
barro é mais abundante).
Fato curioso é a divisão do ninho em dois cômodos. No primeiro a entrada da casa, que permite ao
pássaro entrar sem se abaixar e está estrategicamente posicionada na
direção contrária à chuva e ao vento (estudiosos não conseguem explicar como o
João de barro desenvolveu esta incrível habilidade). O segundo compartimento é forrado
com penas, pelos e musgos e é onde são postos os ovos. Assim os filhotes ficam
bem acomodados, a salvo dos predadores.
A fêmea
coloca de três a quatro ovos no período de setembro a fevereiro. O macho
ajuda a chocá-los. O casal ainda divide a tarefa de alimentar os filhotes, que deixam o ninho após completar 20 dias.
O João de barro não
utiliza o ninho por duas estações seguidas. Parece realizar um rodízio entre
dois ou três ninhos, reparando ninhos velhos semi-destruídos. Quando não há
mais espaço para a construção de novos ninhos, o pássaro o constrói em cima
(até 11) ou ao lado do velho.
Uma vez abandonados, os ninhos são reutilizados por outras
espécies de aves (canário-da-terra-verdadeiro, tuim, pardal e andorinhas).
Também são reutilizados por lagartixas, rãs, pequenas cobras, ratos silvestres
e até por abelhas.
Há várias crendices populares sobre o pássaro. Uma delas diz que o joão-de-barro é
muito ciumento e se desconfiar que está sendo traído prende a companheira no
ninho até que ela morra. Tal comportamento nunca foi registrado
cientificamente, mas virou tema de uma famosa música caipira, interpretada por
Tonico e Tinoco:
"O joão-de-barro pra ser feliz como eu
Certo dia resolveu
Arranjar uma companheira
No vai e vem com o barro da biquinha
Ele fez uma casinha
Lá no galho da paineira
Toda manhã o pedreiro da floresta
Cantava fazendo festa
Pra'quela que tanto amava
Mas quando ele ia buscar o raminho
Para construir seu ninho
O seu amor lhe enganava
Mas nesse mundo o mal feito é descoberto
João-de-barro viu de perto
Sua esperança perdida
Cego de dor trancou a porta da morada
Deixando lá sua amada
Presa pro resto da vida
Que semelhança entre o nosso fardário
Só que eu fiz o contrário
Do que o joão-de-barro fez
Nosso Senhor me deu calma nessa hora
A ingrata eu pus pra fora